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O Conflito, e a arte como diplomacia.

Reflexões de Aácio Viegas, artista contemporâneo português

27 de março de 2021

Vejo o conflito como um rápido movimento centrípeto, yang, circular e contrativo que faz com que o corpo siga para o centro da trajetória, que suga tudo à sua volta, um movimento de grande força e gerador de uma atenção e foco inabaláveis.

Neste movimento o corpo apresenta sempre uma projeção ortogonal ao centro do movimento, ou seja, do ponto de vista do centro, apresenta sempre a mesma forma.
É por isso que o conflito em desequilíbrio, gera egocentrismo, narcisismo e arrogância, por que não permite ver outras perspetivas.
Mas, como não existem um movimento centrípeto perpétuo, pois Yang dá origem a Yin, este mais tarde ou mais cedo dará origem a uma força centrifuga, a força da harmonia, de movimento mais lento, suave e leve, gerador de expansão e abertura à criatividade, ao nascimento e crescimento, ao novo, pois permite que a partir do centro o corpo seja visto de várias perspetivas.

Podemos então dizer que o conflito contém em si a semente da harmonia e quanto maior este for maior a possibilidade de harmonia, de paz. Este é o grande poder do conflito.

O conflito é o gatilho que te leva a mergulhar profundamente no sentimento de paz interior. Apresenta-se como uma grande oportunidade de mudança, para melhor, e quando interiormente tu mudas para melhor, o mundo será também melhor, porque tu aprendeste a transformar o conflito em harmonia.

Como diz na letra da música do Gabriel o Pensador:

“Muda que quando a gente muda
O mundo muda com a gente
A gente muda o mundo na mudança da mente
E quando a mente muda a gente anda pra frente
E quando a gente manda ninguém manda na gente”

Surrender #3 - Impressão digital e pintura acrílica sobre Aluminio (Dibond).

Na arte proponho-me transformar o conflito em harmonia através da diplomacia, da delicadeza no uso das formas e das cores e da empatia profunda e conexão com elas, tornando os diálogos pacíficos, sem exclusão e julgamentos, até que a harmonia do sistema colocado no suporte se estabeleça.

Gostaria de dizer que quando me refiro a harmonia não me refiro a algo em completo equilíbrio, estático, parado, mas antes a um conceito de desequilíbrio reequilibrador que permite a dança subtil entre o conflito e a harmonia, contração e expansão, gerando um movimento capaz de responder rapidamente às questões da mente e do espírito.

A atenção que dou às formas e cores dou simultaneamente e profundamente ao meu Ser, e nelas posso ver revelados os meus desejos, as minhas necessidades, o meu Ego, os meus receios e frustrações e as minhas projeções.

Reparo então que o conflito surge ao nível mental, yang, e que me leva tendencialmente para a culpa, ou desculpa, no sentido de me desresponsabilizar dos meus próprios sentimentos e não olhar para o outro lado da questão, o Amor-próprio puro que cala a mente e ouve a intuição, para que possa dar ao meu Ser e ao meu sistema aquilo que ele precisa.

Quanto mais nos esquecemos da intuição mais forte será o conflito, Yang atrai Yin, Yin atrai Yang, sempre para o equilíbrio do sistema.

Última Ceia - Tomé - Escultura em MDF e Madeira

Na arte como nas relações, a beleza é o processo e a preparação para poder ver claramente a propensão para a culpa e o julgamento, e com isso dar lugar a um estado de empatia profunda, e é a partir desse estado de maturidade e compromisso onde és gentil e autentico e em que estás realmente presente e aberto, que te é revelado o outro lado do conflito, o Amor, a liberdade.

O conflito pede Amor, e para mim a arte é diplomacia que me faz acreditar ser possível manter aberto o coração e devolver Amor ao Não-Amor, criando uma energia suave e abraçando a beleza da vida.

O coração contrai e expande, sem que precises de o controlar.